quinta-feira, dezembro 27, 2007
aaaaaaaaaaaargh
tell me that you'll wait for me
hold me like you'll never let me go
I'm leaving on a jetplane,
don't know when
I'll be back again,
oh babe I hate to go
I hate to go...
...Now the time has come to leave you
one more time, let me kiss you
close your eyes and I'll be on my way
Dream about the days to come
when I won't have to leave alone,
about the times when
I don't have to say...
Equalize
Ai, que dia estranho e quente. Odeio calor, odeio odeio odeio calor. Putz, como eu odeio calor. Pelo menos essa cidade está vazia. Pelo menos eu não demoro duas horas no trânsito pra chegar no trabalho. Mas e daí? Os corredores vazios, as pessoas todas meio sem ter o que fazer, mas mantendo aquela pose de sempre, que eu não suporto, que eu não aguento. Hoje eu só queria ficar aqui quietinha escrevendo, escrevendo, ouvindo a minha musiquinha e escrevendo, escrevendo. Mas não dá. Porque a porra do telefone toca, mas nunca é ele. Porque a porra do chefe me enche de trabalhos sem noção que me dão uma raiva imensa da minha existência inútil. Ainda bem que meu filho estava a coisa mais linda e gostosa da face da terra cantando "bom dia como vai?"com os amiguinhos da creche e eu te digo que eu podia passar o dia inteiro só ali, quietinha, observando cada movimento dele. E não entendo como o pai dele consegue ficar tanto tempo longe. Não entendo, não entendo, mas não quero questionar isso agora. E onde você está agora, seu puto, que não me liga, que não me escreve que não aparece, e eu fico aqui caolha, maneta, perneta, meio torta. Mas que droga, será que você NÃO SENTE O MESMO????!!! Me revolta um pouco, me revolta... Mas passa, vai passar. E meu pai que muda mil e quinhentas vezes o lugar onde vai passar o fim de ano. E a Mary W. parou o blog... Como assim, Mary? Órfã de blogs inspiradores. Órfã... E que tomem no cu as pessoas todas que vem me desejar feliz ano novo. Que tomem nos seus respectivos CUS mesmo, eu só quero que o dia passe e que ele venha me ver, só isso. Não quero um feliz ano novo, quero ser feliz agora AGORA... Porque definitivamente não tô feliz agora. Argh. Que droga. Acho que exijo demais. Das pessoas, dele, do pai do meu filho, do meu próprio pai, do meu filho, da Mary W, de mim, de tudo e de todos. Exijo perfeição sendo que acho o imperfeito tão agradável. Não me emendo, e não me entendo, mas queria tanto tanto entender. Tudo é tão lindo, tão, bom, tão legal, e eu querendo sempre mais, mais MAIS. É justo? Não, não é. Nem um pouco. Nem comigo, nem com ninguém, mas é o que posso oferecer agora. Minhas exigências. Só. Vão encarar?
quarta-feira, dezembro 26, 2007
Tamanco
Visto que tanto ousas,
Não os faças pequenos...
O ridículo está é nas pequenas cousas."
(Mário Quintana)
Tu divagas
Overdose
De alguma forma insana... rs... Engraçado pensar que quem deseja que um amor volte é insano... E não, eu não desejo que nada volte. Não pra mim. Chega. Basta. Paz.
Mutilação
"Boas e bobas, são as coisas todas que penso quando penso em você. Assim: de repente ao dobrar uma esquina dou de cara com você que me prega um susto de mentirinha como aqueles que as crianças pregam umas nas outras. Finjo que me assusto, você me abraça e vamos tomar um sorvete, suco de abacaxi com hortelã ou comer salada de frutas em qualquer lugar. Assim: estou pensando em você e o telefone toca e corta o meu pensamento e do outro lado do fio você me diz: estou pensando tanto em você. Digo eu também, mas não sei o que falamos em seguida porque ficamos meio encabulados, a gente tem muito pudor de parecer ridículos melosos piegas bregas românticos pueris banais. Mas no que eu penso, penso também que somos meio tudo isso, não tem jeito, é tudo que vamos dizendo, quando falamos no meu pensamento, é frágil como a voz de Olívia Byington cantando Villa-Lobos, mais perto de Mozart que de Wagner, mais Chagal que Van Gogh, mais Jarmush que Win Wenders, mais Cecília Meireles que Nelson Rodrigues... Fecho os olhos, faz tanto bem, você não sabe. Suspiro tanto quando penso em você, chorar só choro às vezes, e é tão freqüente. Caminho mais devagar, certo que na próxima esquina, quem sabe. Não tenho tido muito tempo ultimamente, mas penso tanto em você que na hora de dormir vezemquando até sorrio e fico passando a ponta do meu dedo no lóbulo da sua orelha e repito repito em voz baixa te amo tanto dorme com os anjos. Mas depois sou eu quem dorme e sonha, sonho com os anjos. Nuvens, espaços azuis, pérolas no fundo do mar. Clack! como se fosse verdade, um beijo."
(CFA)
sexta-feira, dezembro 21, 2007
Cicatriz
"Menos pela cicatriz deixada, uma ferida antiga mede-se mais exatamente pela dor que provocou, e para sempre perdeu-se no momento em que cessou de doer, embora lateje como louca nos dias de chuva"
(Caio Fernando Abreu - Os companheiros - uma historia embaçada)
quinta-feira, dezembro 20, 2007
Infelizes para sempre
"A verdade é que não havia mais ninguém em volta. Meses depois, não no começo, um deles diria que a repartição era como "um deserto de almas". O outro concordou sorrindo, orgulhoso, sabendo-se excluído. E longamente, entre cervejas, trocaram então ácidos comentários sobre as mulheres mal-amadas e vorazes, os papos de futebol, amigo secreto, lista de presente, bookmaker, bicho, endereço de cartomante, clips no relógio de ponto, vezenquando salgadinhos no fim do expediente, champanha nacional em copo de plástico.
...
Quase todos ali dentro tinham a nítida sensação de que seriam infelizes para sempre. E foram."
(CFA - Aqueles Dois)
domingo, dezembro 16, 2007
Reflexões ao acordar
"Não sei se o mundo é bão
Mas ele ficou melhor
quando você chegou
E perguntou:
Tem lugar pra mim?
Não sei quanto o mundo é bão
Mas ele está melhor
porque você chegou
E explicou
O mundo pra mim..."
(Nando Reis - Espatódea)
Considerações Finais
"OK!"
(Brilho Eterno de uma mente sem lembranças)
"A canção tocou na hora errada
E eu que pensei que eu sabia tudo
Mas se é você eu não sei nada
Quando ouvi a canção,
era madrugada
Eu vi você, até senti tua mão
E achei até que me caía bem como uma luva
Mas veio a chuva e ficou tudo tão desigual
A canção tocou no rádio agora
Mas você não pôde ouvir por causa do temporal
Mas guardei tuas cartas com letras de fôrma
Mas já não sei de que forma mesmo você foi embora
A canção tocou na hora errada
Mas não tem nada não,
Eu até lembrei
Das rosas que dão no inverno
Mas guardei tuas cartas com letras de fôrma
Mas já não sei de que forma mesmo você foi embora..."
(Ana Carolina - A canção tocou na hora errada)
sexta-feira, dezembro 14, 2007
Duelo
(Clarice Lispector)
Fazia tanto tempo que não nos víamos. Tanto tempo. E de repente, quando a sala está vazia, na hora do almoço, a encontro num canto, parada. Não preciso erguer meus olhos do computador para vê-la. Apenas continuo escrevendo, um leve sorriso no rosto. Ela sabe que não me assusta mais. Lentamente ela caminha, meio dançando, meio saltitando, leve, aquele jeito peculiar dela. Pelo canto do olho enxergo seus pézinhos descalços, pequenos e delicados, e ouço sua voz que num murmúrio cantarola mais uma daquelas canções celtas. Uma daquelas que eu mesma a ensinei a gostar. Ela finge não estar nem aí, mas sinto sua ansiedade em dizer algo, em fazer com que eu a note. Não tenho mais problemas com ela. Nem inveja, nem medo, nem nada.
- Você não me escreveu mais - ela diz, voz chorosa
Meus dedos pararam de digitar. Sempre cobranças, pensei. É só pra isso que ela vem. Olhei para o lado,e ela, num movimento brusco se aproximou e parou o rosto a cinco centímetros do meu. Aquele olhar insano de íris multicoloridas me encarava, ameaçador. Não tinha mais receio. Simplesmente comigo aquele jogo não funcionava mais.
- Não tive vontade - respondo, sem me abalar.
Ela joga meu porta-lápis no chão, espalhando os clips de papel pela sala. Parece irritar-se.
- COMO ASSIM?
Volto a olhar o computador, preocupada em salvar o arquivo em que estava trabalhando.
- Você sabe que as coisas não são assim tão simples.
Ela senta na minha mesa, deita nela, folgada, inconveniente, o vestido azul que eu mesma escolhi se espalha pelo teclado. Sua pele tão branca chega a me afligir. Os cabelos vermelhos parecem mais brilhantes do que nunca. Ela está linda, como sempre. Com o documento salvo, me afasto dela e da mesa, empurrando a cadeira de rodinhas para trás. Ela me olha de cabeça para baixo, franzindo as sobrancelhas quase inexistentes, tentando uma ameaça.
- Eu PRECISO de você... Você não pode me negar isso... Não pode... É INJUSTO DEMAIS me negar esse direito. Meu direito de viver, de existir!!!!
Dou risada, alto. Uma gargalhada. Me levanto.
- Eu nego seu direito de viver, Melissa? Compreende bem o que está dizendo? Prestou atenção no que disse?
Ela se levanta, raivosa, batendo com a mão no monitor, que cambaleia mas, ainda bem, não cai.
- VOCÊ NEGA! EU DEPENDO DE VOCÊ!! - notando meu olhar de descaso diante daqueles gritos, ela percebe a falta de empatia e diminui o tom de voz bruscamente, o que deixa mais nítida sua vontade de tentar me manipular - Minha querida... - ela se aproxima e ergue os dedos na direção de meu rosto paralisado - Eu gostaria tanto de caminhar com minhas próprias pernas, mas... - os dedos magros e frios dela, com as unhas curtas pintadas de preto e descascadas encostam nos meus cabelos e os acariciam. Sinto asco - Eu não posso, meu amor... Preciso que me ampare, que me empurre, que sonhe por mim...
Balanço a cabeça, dou mais alguns passos para trás...
- Você é tão falsa. Não é daquele jeito que eu te descrevo. Nunca foi. Sempre foi cruel, vil, maldosa, inconsequente. Só surge daquela forma doce porque empresto MEU jeito de ser pra você...
Os olhos dela se arregalam, demonstrando a loucura patente. Ela avança em minha direção e eu tento me afastar, esbarrando num vaso de planta e derrubando processos no chão.
- EXATAMENTE! Por isso você vai sentar ali naquele negócio - ela não piscava, apontava o computador, descontrolada - E VAI ME TRAZER DE VOLTAaaaaa... Agora!!
A porta se abre, quase que num estrondo. Rapidamente me abaixo para recolher o porta- lápis, os clips, os processos do chão. Ela desaparece. Perguntam se eu estava sozinha, dizem que ouviram gritos lá fora. Respondo que era um mal educado qualquer ao telefone. Sento diante do computador, sem piscar, e escrevo, escrevo, escrevo, olhos arregalados, multicoloridos, multifacetados, quase sem respirar. Dessa vez vai ser um pouquinho diferente, mas você sobreviverá, meu anjo...
O que eu não faço por você, minha menina?? O que eu não faço??
quinta-feira, dezembro 13, 2007
Expiação de pecados
"Comecei a mentir por precaução, e ninguém me avisou do perigo de ser tão precavida; porque depois nunca mais a mentira descolou de mim. E tanto menti que comecei a mentir até a minha própria mentira. E isso – já atordoada eu sentia – isso era dizer a verdade. Até que decaí tanto que a mentira eu a dizia crua, simples, curta: eu dizia a verdade bruta."
(Clarice Lispector - Aprendendo a Viver)
Obscena
O meu vasto querer.
O incompossível se fazendo ordem.
Colada à tua boca, mas descomedida
Árdua
Construtor de ilusões examino-te sôfrega
Como se fosses morrer colado à minha boca.
Como se fosse nascer
E tu fosses o dia magnânimo
Eu te sorvo extremada à luz do amanhecer."
(Do Desejo - Hilda Hist)
Veneração
Daí esses caras todos chegam aqui bem pertinho, quase no pé do meu ouvido, e me explicam. Vem o Caio e diz, senta aqui minha filha, que você tem muito o que aprender da vida ainda. E me fala de amor, e de sexo, com uma simplicidade tão doce, e me explica que a vida pode ser linda mesmo quando não é perfeita. E me diz que pode ser tão mais legal não fazer parte dos padrões pré-estabelecidos. Nunca fui assim, sempre preferi me diferenciar, mas sempre com tanto peso, um peso que não conseguia mais ficar carregando. E me espanto e me enamoro tanto dele que fico que nem boba copiando e colando todos os momentos de epifania que ele me proporciona sem parar a cada texto, a cada conto, a cada frase. E daí vem a Clarice e me diz: ah, menina, você tem tanto o que aprender ainda. Não seja assim tão arrogante. E me fala de humildade, do diferencial da inteligência para o bem e para o mau. E me instiga a refletir mais, e a escrever mais vezes meus pensamentos, mesmo quando eu me sinto assim nesse desinteresse manso que ela descreve. E tenho tanta vontade de devorar tudo o que esses caras já escreveram na vida, e ficar ali só sugando dessa sabedoria toda, que não vem de banco de escola nem nada, vem da vida mesmo, e da observação dela, e da sensibilidade sem tamanho, que dá até inveja. Ai, que inveja de quem se entrega assim, e com tanta qualidade, e se fazendo entender. Daí ela me pega de novo, quase que pelas orelhas, e me explica o que eu passo horas tentando definir. Meu amor pra você, Caio, minha devoção pra você, Clarice, e por favor, se não for pedir demais, as suas bênçãos pra mim, de ambos, que quando eu chegar na sombra da unha do dedinho do pé de vocês eu serei escritora de primeira, sabiam?
"Minhas desequilibradas palavras são o luxo de meu silêncio. Escrevo por acrobáticas aéreas piruetas - escrevo por profundamente querer falar. Embora escrever só esteja me dando a grande medida do silêncio." (Clarice Lispector - Água Viva)
quarta-feira, dezembro 12, 2007
Sete
Sobe o dia tão vertical
O horizonte anuncia com o seu vitral
...E eu trocaria a eternidade por esta noite...
Por que está amanhecendo?
Peço o contrario, ver o sol se pôr
Por que está amanhecendo
se eu não vou beijar seus lábios quando você se for...?"
(Nando Reis - Relicário)
Sentaram-se no chão da rodoviária mesmo. Na verdade, ela não estava mais se importando com o lugar. Precisava urgentemente começar a assimilar o fato de que eles estariam fisicamente separados daqui em diante, e sabe-se lá por quanto tempo. E faltava tão pouco. Uma hora. Uma hora para subir novamente naquele ônibus e voltar ao mundo real.
Quando estavam sozinhos, tudo parecia andar mais lento. Ela se lembrava do quanto foi demorada a última hora de viagem antes de encontrá-lo. Simplesmente os minutos não passavam, a ansiedade era tão forte. Mas quando estavam juntos as horas passavam voando, por mais que eles tentassem fazer o tempo parar de vez em quando. Bem diante deles, um gigantesco, insensível e implacável relógio fazia questão de lembrá-los da passagem de cada segundo.
E o que era afinal o tempo, uma medida, uma padronização, um lapso um período determinado, mas por quem, por que, pra que? Não. "...Temos nosso próprio tempo...", ele sabia disso também. Para eles, 24 horas poderiam durar 20 minutos. Ou um dia poderia durar séculos. Puras convenções, afinal. Mas estavam sujeitos a elas, infelizmente, mas felizmente havia ainda algum tempo para olhar para ele, encostar a cabeça no ombro dele e deixar-se abraçar. Havia tempo ainda para beijá-lo e para tentar guardar em algum lugar aquelas sensações todas, aquelas impressões todas, infinitas percepções.
Dividiam os fones e uma história agora, e ela estava prestes a ser interrompida. Está bem, não era uma interrupção. Era uma pausa. Estariam pausados agora, pelo menos naquele estado. Maldiziam o pobre relógio, que nem tanta culpa assim tinha.
E quando não puderam mais evitar, quando não tinha mesmo mais jeito, desceram as escadas, e seguiram pra plataforma de embarque. Ela iria primeiro. Um abraço, forte, e ela sentindo que ele não gostava muito dessa história de despedida. E então soltou as mãos dele e com grande tristeza simplesmente foi.
Olhou pra trás alguns segundos, mas não voltou mais. Subiu e seu coração partiu ao meio. A outra metade ficou lá fora, sentado, sério, com o pé num banco. E teve tanto medo de perdê-lo naquele momento, que quase desceu correndo as escadas de novo. Mas não podia. Ficou olhando pelo vidro enquanto ele se levantou e foi embora, também sem olhar pra trás. Era tão difícil de saber o que se passava naquela hora. Teve vontade de chorar, de gritar, de não ser tão covarde, de não se preocupar tanto com o que os outros achavam.
E foi então que o celular dela tocou. Era ele, e ela sabia disso antes mesmo de atender. Sorriu, um pouco mais aliviada, e trocaram mais algumas palavras de carinho. Não sabia mais como fazia pra ficar sem ele, mas teria que aprender, e rápido. E assim, como se não significasse nada, o ônibus simplesmente foi embora. Ele agora era ausência, banco vazio ao lado dela. Não queria mais música nenhuma, sem ele. E não queria afago nenhum que não fossem os dele. E era só ele que ela queria. E como doía, como doía...
"...Eu não queria ir assim...
Tão triste, triste...
Como vai ser ruim demais
Olhar o tempo, ir
sem ver os seus abraços,
seus sorrisos
ou suas rimas de amor..."
(Los Hermanos - Assim Será)
"...A voz do outro, a respiração do outro, a saudade do outro, o silêncio do outro. Sim, afligia muito querer e não ter. Ou não querer e ter. Ou não querer e não ter. Ou querer e ter. Ou qualquer outra enfim dessas combinações entre os quereres e os teres de cada um, afligia tanto..." (CFA)
terça-feira, dezembro 11, 2007
Cinco
Ele a encarava com aquele olhar indecifrável. Era sério demais às vezes, e ela tão boba, rindo a toa. Ele também ria, claro, também brincava, mas em alguns momentos aquela seriedade a desconcertava. Seria timidez? Que se passava ali? Receio? Julgamento? Ele a observava. Cada movimento. Sentado diante dela na mesa, no elevador, pelos cantos daquele quarto, pelo reflexo no espelho, enquanto caminhavam, ele sempre a fitava. Ela tentava juntar as peças todas daquele quebra cabeça, sem sucesso. Sentia aquele olhar mesmo sem vê-lo diretamente. Era forte a sensação de ser observada por ele, mesmo que esquivamente. Ser estudada daquela forma, quase despida, só com os olhos. Depois era ela a dona dos olhares oblíquos. Injustiça completa... Tinha certeza de que poderia esquecer de tudo aquilo, daqueles abraços, daqueles beijos, do cheiro, do toque da pele dele, até de sua voz, já tão familiar. Mas tinha certeza que nunca esqueceria daqueles olhos. Ele parecia mergulhar nela, na verdade. Parecia buscar sua essência, decifrá-la, procurar por tudo o que era inerente ali, mas não aparecia assim tão facilmente. Ele parecia tentar achar seu verdadeiro eu. Aqueles olhos castanhos, meio puxadinhos, pequenos e tão misteriosos, quase desconfiados, a derrubavam, faziam dela o que eles quisessem fazer. Estava entregue, era propriedade dele já. Mesmo sem comprender muito bem, mesmo sem saber direito as intenções que guardavam, as sensações que tinham, ela já o amava daquela forma, e amava por amar, sem perguntar se ele aceitaria ou não ser amado, se compartilharia daquele sentimento todo. Só queria poder se dedicar àquele sentimento e a ele com todas as forças que tinha, e era o que fazia agora, e o que faria daqui pra frente, quem sabe até quando, muito provavelmente até quando ele permitisse... E que fosse por longo tempo...
quinta-feira, dezembro 06, 2007
Três
quarta-feira, dezembro 05, 2007
Carta pra menininha cor de rosa
Agora faz assim, enxuga essas lágrimas, levanta essa cabeça, senta aí quietinha e me escute bem. Olha só, começamos até que bem. O primeiro mandamento você até já conhece. Na verdade, você o pratica: Seja clara com eles. Seja sincera, exponha seus sentimentos. É básico, simples, eles gostam das coisas assim, às claras. Tentar fazer com que eles entendam algo sem ser direta costuma dar errado. Eles não funcionam assim como nós.
Essa parte você já fez, ok? Disse o que sentia, explicou, foi clara. Agora é o turno dele. É um jogo, por mais que você diga que não sabe jogar ou que não gosta de brincar, tem que obedecer as regras. Existem duas possibilidades no turno dele. Sim ou não. É, é simples assim. Sim, em geral, costuma querer dizer sim. E não é não. Pois é. Nem é tão complicado, né? Homens são mais simples. Eles não têm essa péssima mania feminina de dizer sim querendo dizer não ou vice-versa. Pode ser meio cruel quando a resposta dada não é a que imaginamos, mas fazer o que, né? Vida continua, criança...
Com a sua resposta em mãos, passamos para o terceiro ponto. Se a resposta for sim, nêga, se joga! Agora, se for não... Bem, temos um impasse. Claro que é triste, é chato, é desagradável, mas convenhamos... Não será nem a primeira nem a última vez, ok? Portanto dê tempo ao tempo. Chore suas pitangas, quebre umas coisas, devore uma caixa de bombons, saia pra caminhar, enfim... Assimile a situação. Depois disso, aguarde, espere, se possível bem longe dele.
A próxima dica é bem importante... Anote: Não insista! Sério isso... Cara, como isso é sério. Não insista! Não se humilhe... Cada tentativa insistente sua diante da negativa do cara é um passo mais distante que você estará dele. Não ligue, não escreva, não procure, não fale... No máximo seja educada e sucinta se ele por acaso falar com você. E pronto. Por mais que doa, por mais que machuque um pouco. Faça isso por você mesma.
Deixe passar um tempo, o quanto for preciso. Até seu coração se acalmar, até a dor de cotovelo passar, até você voltar a vê-lo como amigo de novo ou até você olhar pra ele, rindo, e dizer... Putz, que foi que eu vi nesse mané? rs...
Não pense que eu estou sendo insensível... É chato ser rejeitada. Ah, é sim. A gente fica procurando descobrir o que tem de errado, afinal. Será o cabelo? O jeito de falar? To gorducha? Sou uma chata? Nem é... Quer dizer... Até pode ser... Mas pode ter certeza que essas coisas não tem explicação mesmo.
Simplesmente, às vezes algo “bate”... E sempre vai ter um cara que vai achar seu cabelo lindo mesmo quando você acorda parecendo uma maluca, que vai achar seu jeitinho nasalado ou fanho de falar o mais fofo do mundo, nem vai ligar pra sua barriguinha ou pras suas chatices. Sério. Keep walking, girl… Quando uma porta fecha aqui, uma janelinha abre ali, pode ter certeza...
E se essa conversinha toda não adiantar, querida, vamos ter que ter outra, um pouquinho mais séria, falando sobre invasão de território e propriedade privada... Mas tenha certeza que se isso for preciso eu não vou ser assim tããoo didática, ok?... Se cuida…Boa sorte néin! Beijonãomeliga!
"Chorar por tudo que se perdeu, por tudo que apenas ameaçou e não chegou a ser, pelo que perdi de mim, pelo ontem morto, pelo hoje sujo, pelo amanhã que não existe, pelo muito que amei e não me amaram, pelo que tentei ser correto e não foram comigo. Meu coração sangra com uma dor que não consigo comunicar a ninguém, recuso todos os toques e ignoro todas tentativas de aproximação. Tenho vergonha de gritar que esta dor é só minha, de pedir que me deixem em paz e só com ela, como um cão com seu osso. A única magia que existe é estarmos vivos e não entendermos nada disso. A única magia que existe é a nossa incompreensão."
(Lixo e Purpurina / Ovelhas Negras - Caio Fernando Abreu)
terça-feira, dezembro 04, 2007
Um
Quando ainda estava dentro do ônibus, o enxergou lá fora. Sorriu quando reconheceu a camiseta vermelha e percebeu que ele havia prendido os cabelos do jeito que ela havia dito que gostava. Mordeu os lábios de nervoso. Pensou em se esconder atrás da cortina. Sentiu que estava tão perto dele. Mais perto do que jamais havia estado. O coração acelerou de tal forma que ela achou que ia passar mal. O motor do ônibus desligou. Era a hora. As pessoas se aglomeravam no corredor, prontas pra descer. Tanta gente, cada um com seu motivo pra estar ali naquela cidade, cada qual com suas coisas para fazer, com seus problemas pra resolver. E o maior problema dela era reunir forças para se levantar dali e caminhar até ele. Eram só alguns passos que os separavam agora. Levantou-se, enfim. Ajeitou os cabelos, colocou a mochila nas costas. Estava pesada demais, a bolsa. Sempre fora desmedida com essas coisas. Fazer malas, escolher o que levar. Era difícil para ela selecionar o que era imprescindível e o que era futilidade. Sempre acabava esquecendo das coisas importantes. Olhou para fora, como quem busca coragem. Lá estava ele. Não via o rosto, só a camiseta. O fluxo de pessoas caminhava, e ela então se misturou àquelas pessoas. Sentiu-se feia. Teve medo dele não gostar dela. Aquela insegurança invasora, que parecia dominá-la, aprisioná-la, paralisá-la. Aquela necessidade de aprovação, de ser sempre a menininha perfeita ao olhar do outro, mesmo que morrendo por dentro para alcançar tal ideal. Não queria mais morrer por dentro. Não com ele. Queria que a aceitasse, somente. Daquele jeito imperfeito. Desejava de coração que tudo desse certo. Enquanto caminhava, tentava respirar. O ar parecia fugir. As escadas. Ficou pensando que ele enxergaria seu all star e tremeu por dentro. Um, dois, três degraus. O último desceu num salto, com os dois pés. Não sabia bem porque havia feito aquilo. Às vezes agia daquela forma impulsiva mesmo. Era de sua natureza. Depois logo se arrependia e se achava boba, tão boba. Será que ele havia reparado? Mas agora não adiantava mais, já tinha feito. Sorriu quando seu olhar encontrou o dele. Tão preocupada ela estava com aquele gestual todo, com aquele parecer impecável, que se esqueceu de reparar nas reações imediatas dele. Ele sorria, e isso deveria no mínimo ser um bom sinal. Mais dois passos, e lá estava. Não dava mais pra voltar atrás. Um abraço, tímido, e ela ali, falando demais, logo de cara. Era quase compulsivo. Falar demais, pensar de menos. Quanto mais falava, menos pensava no medo, na falta de jeito, na vergonha, na insegurança. Procurou sua mão, como havia prometido. Foi tão longo o caminho até ali. Apertou a mão dele, entrelaçada à dela. Era como um sinal. Ele correspondeu, sorrindo. Um beijo, era o que ela queria, só um beijo. Comprovação de qualquer coisa. Confirmação do que era tão incerto. Mas não veio o beijo. Não ainda. Talvez se ela calasse a boca por pelo menos um minuto ele conseguisse dizer algo, fazer algo, mas não foi assim. Inconscientemente, enquanto despejava todos os seus problemas nas costas dele falando e falando sem um minuto de descanso, ela se protegia covardemente daquela certeza. Se escondia, como a perfeita boba que era, morrendo de medo de passar a desejar aquele beijo pro resto de sua vida inteira.
"Vida da minha alma:
Um dia nossas sombras
Serão lagos, águas
Beirando antiqüíssimos telhados.
De argila e luz
Fosforescentes, magos,
Um tempo no depois
Seremos um só corpo adolescente.
Eu estarei em ti
Transfixiada. Em mim
Teu corpo. Duas almas
Nômades, perenes
Texturadas de mútua sedução.
(LXVII)
(Hilda Hist - Cantares de Perda e Predileção)
Llenando de inquietud mi corazón
"...Num deserto de almas também desertas, uma alma especial reconhece de imediato a outra — talvez por isso, quem sabe?..."
(trecho de "Aqueles Dois" - Caio Fernando de Abreu)
"Tú me acostumbraste
A todas esas cosas
Y tú me enseñaste
Que son maravilhosas
Sutil llegaste a mí
Como la tentación
Llenando de inquietud
Mi corazón
Yo no concebía
Como se queria
En tu mundo raro
Y por ti aprendi
Por eso me pregunto
Al ver que me olvidaste
Por qué no me enseñaste
Cómo se vive... Sin ti?..."
(Tú me acostumbraste - Frank Dominguez - Cuba-1955)
nunca mais
"...Deixamos pra depois uma conversa amiga
que fosse para o bem, que fosse uma saída
Deixamos pra depois a troca de carinho
Deixamos que a rotina fosse nosso caminho
Deixamos pra depois a busca de abrigo
Deixamos de nos ver fazendo algum sentido
Deixamos de sentir o que a gente sentia
que trazia cor ao nosso dia a dia
Deixamos de dizer o que a gente dizia
Deixamos de levar em conta a alegria
Deixamos escapar por entre nossos dedos
A chance de manter unidas as nossas vidas
Amanhã ou depois, tanto faz se depois
for nunca mais... nunca mais..."
(Nenhum de Nós - Amanhã ou depois)