quarta-feira, julho 15, 2009

Melissa e Kapeller - 1

SP, Dezembro - 1998
- Eu te amo, Chris... E você nunca, nunca mais vai ouvir isso de mim...
Ele se levantou, batendo a calça, limpando a sujeira
- Temos coisas a fazer, Melissa... Chega!
SP, Janeiro - 1998

- Hey... Eu te amo! Eu te amo, eu te amo, Chris... Não me deixe sozinha, por favor... Por favor, por favor, por favor...
- Achei que você tinha dito que eu nunca mais ia ouvir isso de você.
- Eu menti!!
- Essa instabilidade tem que terminar por aqui. Não vou mais tolerar esse tipo de resposta de você.
- Onde você vai?
- Não importa. Eu voltarei quando sentir que você evoluiu, que aprendeu com as experiências, que não está mais considerando que seu umbigo é o centro do universo.
- O centro do meu universo é você........
- Adeus...
A porta bateu diante do rosto dela, e ela caiu no chão, desesperada. Urrava de dor, porque realmente doía demais.

“...Sem carinho, sem coberta
No tapete atrás da porta
Reclamei baixinho
Dei prá maldizer o nosso lar
Pra sujar teu nome, te humilhar
E me vingar a qualquer preço
Te adorando pelo avesso
Pra te mostrar que ainda sou tua
Até provar que ainda sou tua...”
(Chico Buarque - Atrás da Porta)

SP, Fevereiro - 1998

Quando ele abriu a porta do minúsculo apartamento, logo ouviu o barulho frenético das teclas do computador. Ela fez uma pausa de dois segundos contados e logo recomeçou a esmurrar o teclado com fúria.

Não se virou para encará-lo. Não precisava mais fazer isso. Os incríveis sentidos aguçados que ela vivia treinando fizeram com que ela simplesmente soubesse que era ele. Parou por mais alguns segundos para consultar algumas linhas de um entre os vários livros abertos na mesa, ao lado dela e continuou então a escrever. Ele se sentou, como sempre fazia, ao lado do gato, no sofá a cada dia mais empoeirado.

Os pêlos de Kith se ergueram diante da presença de Chris e o bichano decidiu então terminar seu cochilo em outro cômodo da casa. Quando o silêncio cortado pelo ruído incessante do teclado o incomodou, ele finalmente falou, sorrindo:

- Boa noite pra você também, Melissa
- A cada ação, corresponde uma reação... – falou sem parar de digitar e sem retirar os olhos da tela do computador
- Já entendeu o mecanismo?
- Sim, por isso estou reagindo
- Ótimo. Acho que posso voltar aos seus ensinamentos agora então.
- Estarei pronta, Kapeller
- Não precisa ser assim, menina..
- A lição foi aprendida. Próximo tópico.
- Olhe para mim.

Ela se virou, o semblante era sério, mas tranqüilo, controlado. Ele sorria.

- A próxima lição é sobre equilíbrio. Pender demais para cada um dos lados faz com que você perca a razão, seja pelo excesso de emoção, ou pelo excesso de frieza.

Ela se virou para o computador novamente, calada, mandou imprimir o texto que estava escrevendo. Após algum tempo, se levantou, pegou a folha e entregou para ele, no sofá.Ele leu o texto impresso e sorriu.

- Um tanto quanto esquisofrênico... Mas válido...

Ela riu de volta enquanto ele devolvia o papel pra ela, que trazia a mesma frase escrita dezenas de vezes: estava com saudades, seu idiota! estava com saudades, seu idiota! estava com saudades, seu idiota! estava com saudades, seu idiota! estava com saudades, seu idiota! estava com saudades, seu idiota! estava com saudades, seu idiota! estava com saudades, seu idiota! estava com saudades, seu idiota! estava com saudades, seu idiota! estava com saudades, seu idiota! estava com saudades, seu idiota! estava com saudades, seu idiota! estava com saudades, seu idiota! estava com saudades, seu idiota! estava com saudades, seu idiota!

“...É por isso que se há de entender
Que o amor não é um ócio
E compreender
Que o amor não é um vício
O amor é sacrifício
O amor é sacerdócio
Amar é iluminar a dor -
como um missionário...”
(Chico Buarque - Viver do amor)

SP, Março - 1998

- Por que você me escolheu, Kapeller?
- Porque tinha que ser, Mel...
- E por que tinha que ser?
- A vida não é o que nos acontece. É o que a gente faz com o que nos acontece.

“Meu bálsamo benigno
Meu signo
Meu guru, porto seguro
onde eu voltei...”
(Meu bem, meu mal - Caetano Veloso)

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