terça-feira, abril 13, 2010

Melissa e Kapeller 11



- Quando te vi pela primeira vez, daquele parapeito ali - e ele apontava um lugar indefinido da escuridão da janela do meu quarto - tive certeza de que seria você.
- Não, não teve.
- Você acha mesmo que eu te diria isso?
- Acho que não, por isso estou duvidando.
Ele sorria, os dedos passando suavemente pelo meu rosto. Estávamos deitados em cima do tapete redondo do chão, diante da janela, de onde enxergávamos o céu sem estrelas da noite de São Paulo. Os rostos próximos, mas sem nos encararmos.
- Não diria mesmo. Não para aquela menina. Ela não ainda estava preparada para saber.
- Aquela menina ainda está aqui, Chris.
- Será?
- Coberta por uma armadura de aço, mas está.
- Não consigo reconhecê-la.
- Assim como eu não consigo mais reconhecer você.
Nos olhamos por alguns segundos, mas foi impossível segurar o mal estar. Voltei a olhar pro céu. Ele quebrou o silêncio novamente:
- Não era game over?
- Digamos que você tinha um "continue" ainda.
Ele riu alto, como eu nunca antes o havia visto fazer.
- Isso deve querer dizer que eu jogo bem...
- Ou tem as senhas certas...
- Que sorte a minha
- Que sorte a minha
Sorrimos, e dessa vez os olhares conseguiram se encarar por mais tempo. Muito mais tempo.

"De tanto te esperar
Eu quero te contar
Das chuvas que apanhei
Das noites que varei
No escuro a te buscar
Eu quero te mostrar
As marcas que ganhei
Nas lutas contra o rei
Nas discussões com Deus
E agora que cheguei
Eu quero a recompensa
Eu quero a prenda imensa
Dos carinhos teus..."

(Chico Buarque - Sem fantasia)

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