terça-feira, novembro 24, 2009

Dungeons & Dragons


“- Meu nome é Krystall- E o meu é Meurum. Ao ouvir nome do ser, Krystall sentiu um crepitar em seu corpo, como uma chama vinda de dentro de sua mente, de dentro de seu coração...”

Fechei os olhos e comecei a cair, cair. O fim da queda não chegava. Minha cabeça girava sem parar enquanto imagens surgiam em flashes rápidos.

Minha querida irmã, seu sorriso tão verdadeiro, seus olhos cor de esmeralda tão diferentes dos meus, os cabelos negros e longos, esses sim idênticos em nós duas. Nossos primeiros poderes se manifestando como brincadeiras de criança, a intolerância e o preconceito que sofríamos em nosso pequeno povoado por sermos humanas que usavam magia natural, “sem estudo, sem explicação”, o pacto que fizemos antes de nos separar para sempre, a viagem até Époupai, minhas primeiras apresentações como dançarina de rua, a primeira vez que vi o doce Mórion enquanto me apresentava em uma taverna da cidade, o treinamento em magia intuitiva que recebi dele, seu sumiço sofrido e repentino, a grande inundação, o grupo de aventureiros formado, as batalhas que se seguiram, terminando com nossa queda no misterioso portal, tantas cenas, tantas lembranças, mas de repente uma parada brusca e uma sensação muito, muito ruim.

Abri os olhos. Lá estava eu estendida no chão da floresta. A fisionomia de Meurum me encarou em meio à folhagem e aos poucos raios de sol. Assim que seu rosto se tornou mais nítido, pude ver que ele pronunciava algumas palavras em uma língua estranha. Senti então meu corpo queimar. Era como uma febre alta, um calor que vinha de dentro para fora. Comecei a suar. Os dedos dos pés e das mãos formigavam. Pensei que ele estivesse me atacando e me desesperei. Buscava o ar para respirar e ele não vinha. Tentava gritar para meus companheiros e a voz não saía.

A visão escureceu novamente e meu corpo começou a convulsionar sem controle. Novos flashes, novas cenas, dessa vez nada familiares.

Vi minha irmã combatendo com desenvoltura um grupo inimigo. Ela usava magias que eu nunca havia visto antes. Com os cabelos soltos e esvoaçantes, apoiada com a mão esquerda em um poderoso cajado, ela disparava chamas que saíam diretamente dos dedos de sua mão direita e atingiam os inimigos em cheio, cobrindo-os por aquela energia infernal. Depois, ainda usando a mesma mão direita, sua poderosa magia criava uma garra escura e sinistra que rasgava seus oponentes e os arrastava para longe com uma violência assustadora. Empunhando o cajado, ela disparava uma rajada de energia crepitante na direção dos inimigos ou então fazia aparecer sobre os combatentes uma lava pegajosa e líquida que queimava tudo o que encontrava. Eu estava delirando, mas parecia muito real. Tão real que eu instintivamente chamei por minha irmã. Ela virou-se. Em uma fração de segundos, desapareceu e quando reapareceu já estava a poucos metros de mim, com os olhos brilhando em tons, de vermelho, violeta, laranja e por fim... Negros. Negros? Mas, então...

Uma gargalhada misteriosa me fez voltar à realidade e abrir meus próprios olhos negros num susto! Era Meurum quem ria enquanto segurava o cajado dos meus delírios.

- Sim, garota. Aquela é você, Kristall... Esses são seus poderes de agora em diante e até o momento em que você me entregue o medalhão de minha senhora. Acredito que agora você já está preparada para usá-los!

Num piscar de olhos o ser sumiu e só o cajado ficou em seu lugar, encostado em uma das árvores. Estiquei os dedos para alcançá-lo mas antes disso, num ímpeto, arranquei o véu que antes deixava somente meus olhos à mostra e soltei meus longos cabelos. Já era hora de parar de se esconder. Segurei o cajado com firmeza e foi como se ele sempre tivesse sido meu.

“Mal teve tempo para se recuperar da estranha sensação quando ouviu gritos ao longe.”

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