segunda-feira, novembro 22, 2010

Prosa da separação - parte 1

A única coisa que eu lembro é que eu fui te buscar bêbada no metrô. Tá, você não entendeu. Eu me lembro de muitas outras coisas, mas do fim, de quando acabou mesmo, eu só lembro disso. Juntei toda minha dignidade que se espalhava em pedacinhos pelo chão da cidade e fui até você. Porque parecia que eu te devia isso. Te devia essa satisfação, essa atenção, ou seja lá o que possa ter significado meu nobre gesto. Eu andava com raiva já, nesse ponto. É, raiva. Raiva não é um sentimento legal pra gente cultivar por alguém com quem passou tanto tempo junto. Mas eu tinha. Uma raiva de quem está apertada numa caixa, sem respirar, e de repente encontra a pessoa que te prendeu lá. Não, não me entenda assim tão literalmente. Estou resgatando sensações, e são elas as que surgem quando penso naquele começo de manhã em São Paulo, eu caminhando pela Frei Caneca com todo o peso da culpa nas minhas costas. Caminhando até você. Bêbada, com uma informação fixa na cabeça: "preciso chegar até o metrô, preciso chegar até o metrô". Você fez piada, como sempre, e eu que já andava brava me irritei ainda mais. Você nunca entendeu bem minhas reações negativas ao seu eterno bom humor, eu sei. E foi isso. Não sei dizer mais nada sobre nós. Lembranças doloridas são deletadas por um filtro especial da minha mente. Não sei se é bom ou ruim ter o tal filtro, mas já aprendi que é difícil resgatar sozinha qualquer informação lá de dentro. Dói. Daí vira e mexe acabo mesmo desistindo de procurar demais. Então fico com essa cena. Meu rímel borrado, e você rindo, rindo. Fade out.

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