quarta-feira, outubro 24, 2007

Trocando em miúdos

“Eu vou lhe deixar a medida do Bonfim
Não me valeu
Mas fico com o disco do Pixinguinha, sim!
O resto é seu...”

(Chico Buarque – Trocando em Miúdos)

Quando em meados de 1999 eu entrei naquele jogo de RPG on line dando um chute na porta e me enfiando com a minha personagem no meio de uma ação toda complicada sem nem pedir licença pra ninguém, eu nem sequer imaginava que ali naquele cenário tão sem importância eu iria conhecer um grande amigo.

Grande amigo é uma boa expressão, gosto dela. Eu e ele já paramos pra conversar outro dia desses sobre a nossa amizade, mas sei lá, acho que entre a gente as explicações e definições desse tipo não funcionam muito. É questão de afinidade, ele diz, amigos por simples desejo de estarmos juntos e dividindo momentos, sejam eles divertidos, tristes, ou apenas mais um dia comum como todos os outros.

Somos diferentes. Muito diferentes! No começo esse jeito de ser dele me confundia um pouco, não entendia algumas ironias, aquele jeito tão dele, meio fechado, meio gato escaldado, escapando pelas tangentes. Aquele menino que tinha praticamente a minha idade, mas trazia uma bagagem tão forte. Era algo que nem precisava ser dito, eu sentia a maturidade dele, uma diferença no lidar com as situações, no tratar com as pessoas, na compreensão dos fatos todos que eu ainda não alcançava.

Achava que ele era frio comigo a princípio. Que tolice a minha enxergar carinho de uma forma tão limitada. Ele não mandava um beijo quando se despedia, se bobear até hoje não manda, aquele cabeça dura, rs... Mas o que vale mais, um beijo escrito só pra ser como todo mundo ou a simples demonstração do quanto ele se importava e se importa comigo de todas as outras formas, centenas de formas, possíveis e imagináveis.

Hoje eu entendo melhor, e respeito muito esse jeito de ser dele. Mudei tanto. Me sinto mais próxima dele nesse sentido, talvez porque a vida também andou me ensinando algumas coisas e nada seja mais tão simples e florido quanto era quando eu tinha 20 anos. E então, quando a gente entende algumas coisa na vida, os beijos e as palavras soltas, escritas ou ditas sem real significado, deixam de ter o mesmo valor e a importância de antes.

O que gosto no nosso lance é a falta de obrigação. Não tem hora, não tem jeito certo de começar conversa, não tem papo que não possa ser levado, nem assunto que não possa ser tratado. Não tem cobrança, sem ser de brincadeirinha. Vamos do carinho ao sarcasmo em poucos segundos, da brincadeira mais infantil ao papo mais sério sem grandes neuras. Das primeiras horas da manhã à alta madrugada, teclando, teclando, só porque a gente se entende, só porque se sente bem assim.

Sim, é um amigo virtual. Quem diz que não é possível nunca experimentou e está perdendo tanto, tanto... Já nos falamos sim por telefone, mas faz tempo. Cinco anos. Era um momento tão essencial da minha vida, aquele. E lá estava ele. Porque sentia junto comigo, porque se preocupava, porque queria estar ali, e estava, mesmo sem a presença física. Não lembro mais da voz dele. Logo eu, que me apego tanto aos timbres, seria incapaz de reconhecê-lo pela voz.

Já vi algumas poucas fotos, talvez o deixasse passar ao meu lado sem reconhecê-lo. Ou talvez o encontrasse no meio de uma multidão sem pensar duas vezes. Não dá pra saber. Talvez a gente se encontre um dia desses, embora atualmente eu não consiga visualizar exatamente como, mas acho que seria bom dar um abraço e agradece-lo por estar sempre ali, mesmo quando eu, tão boba, já achava que ele tinha ido embora.

Não vai mais embora. Já deu provas de que veio pra ficar, e vai sempre estar aqui comigo, não por obrigação, mas pelo simples prazer de estar.

AJ, querido, amo você, e tenho a mais absoluta certeza de que você entende os motivos, as razões, e as sem razões do meu amor.

“...Eu te amo porque te amo.
Não precisas ser amante,
e nem sempre sabê-lo.
(...)
Porque amor não se troca,
não se conjuga nem se ama.
Porque amor é amor a nada,
feliz e forte em si mesmo.”

(Drummond – As sem razões do amor)

Um comentário:

Anônimo disse...

Que sorte a dele, que sorte a sua, que sorte de vocês.

Lindo texto. Adorei seu espaço.